quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Parte II

Jacinto era o filho mais velho de seu Batista, e também o mais apegado ao pai, que desde logo tratou de colocar a loja da família aos cuidados do filho. Jacinto aprendeu tudo com o pai; balanço, comerciar com os fornecedores, o marketing de seus produtos, sempre ressaltando o preço mais em conta da região... enfim, seu Batista era só orgulho com Jacinto.

Certa vez, seu Batista se escondera, dizendo a Jacinto que iria ao banheiro e que este cuidasse da loja até que voltasse, entra neste momento um senhor carrancudo e muito esnobe, seu Fernandes – isso mesmo, o que falecera outrora nesta história – destratava quem pudesse ver, e não era novidade desfazer das pessoas usando toda sua arrogância.

- Quero comprar a loja! Quanto é? – Seu Fernandes encenava abrir a capanga de couro preta, enquanto gozava da cara do garoto, que de pronto lhe respondeu:

- Desculpe moço, mas a loja não está à venda. Não colocamos nenhum anúncio para tal. Nossa loja é a mais completa da região, e é preciso muitas posses para comprá-la, se o senhor tiver algum dia esse dinheiro, tratarei de lhe informar da venda. Enquanto Fernandes ficara catatônico diante do prodigioso e atrevido garoto, Batista dava socos na parede de alegria ao ver seu filho de 11 anos desbancar o homem mais boçal da cidade, coisa que sempre quis fazer, mas sua política de trato ao cliente o impedia. Vendo sair o furioso Fernandes, Batista sai da “toca” e abraça o filho como quem erguia a taça Jules Rimet. No momento em que abria a loja naquela manhã, Jacinto lembrava com lágrimas nos olhos desse momento com seu pai que falecera no dia anterior.

Ele não aceitava a idéia do pai vir a falecer tão cedo, 45 anos, e de infarto, um homem que dificilmente era acometido por qualquer enfermidade, pois sempre se preocupou com a alimentação; nada de gorduras, comidas oleosas ou sal além da conta, e era de praxe um rachinha de futebol nos fins de semana para manter o vigor físico. Talvez por trocar tiros com algum delinqüente que viesse a afanar Umatinga, ou deglutir inadvertidamente alguma droga que corrompesse sua saúde, qualquer outra "causa mortis" poderia ser mais assimilável na cabeça de Jacinto que infarto. Não... era demais para um filho que sempre invejara a saúde do pai. A mãe já tinha ido também muito cedo, um acidente bestial que envolveu o filho de Fernandes, Osvaldo Júnior. Este vinha bêbado em alta velocidade em seu pick-up no centro da cidade e acabou por atingir dona Marta, esta ainda minguou forças para se despedir do marido e dos filhos no hospital antes do seu último suspiro.

JR, como era conhecido, fôra condenado, a pena não tão severa, apenas ajudar na limpeza das ruas da cidade pela manhã, quando ainda não se via cidadão algum trafegar, e por tanto, livre de maior desonra. O advogado argumentou que: “O jovem não se encontrava bêbado, pois tão logo houve o acidente, foi consciente, e incontinenti prestou socorro à vítima lhe chamando ambulância, e isto mostrava não só a sobriedade do rapaz, bem como sua boa índole, sem a qual não teria prestado socorro à dona Marta, que Deus a tenha”. Todas aquelas palavras eram insultos à imagem de Marta, e amiudado o coração, seu Batista recebeu o resultado da condenação por meio de Eva, pois não teve forças para seguir presente no julgamento. Todos ali sabiam que tão logo ocorreu o acidente, JR se encarregou de telefonar para o pai, que antes de qualquer outra atitude, tratou de evocar os serviços de seu advogado, Dr. Valmir, este foi quem desdobrou todas as questões lícitas e ilícitas para conduzir o caso de homicídio doloso eventual à um simples acidente de trânsito.

Eva veio conversar com Jacinto, dizendo-lhe que Fernandes havia falecido naquela manhã.

- Não tenho certeza meu irmão, mas creio que a morte de Fernandes ainda não está totalmente esclarecida... - Eva era uma garota que se destacava não só por sua beleza, mais ainda era de uma inteligência ímpar, o que tornara comum lhe prestarem honrarias por suas atuações frente aos casos competentes à polícia de Altaneira, o que não causava muito gosto a seu Batista, ainda não lhe digeria bem a idéia da filha lidar com algo tão perigoso como a polícia, mas que a apoiava em tudo, e sempre lhe perguntava sobre os casos, de como ela conseguia resolvê-los, ficava feliz pela astúcia da filha, que era acima da média, ao fim lhe dava os parabéns, mas nunca se esquecia do “tome cuidado minha filha”.

- E nem a de nosso pai, Eva. Completava Jacinto, compenetrado em seu raciocínio.


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